sábado, 8 de março de 2014

"História com Recadinho" de Luísa Dacosta

Um livro 
     Desejas um tapete mágico que, num abrir e fechar de olhos, te leve aos confins da Terra?
    Uma máquina de viajar no tempo, para o futuro a haver, desconhecido, para o passado histórico ou para aquele em que os animais falavam?
    Companheiros para correrem contigo a aventura de mares ignorados e de ilhas que os mapas não registam?
     Conhecer mundos para além do nosso sistema solar, a anos-luz da nossa galáxia, sem necessidade de foguetão?
     Saber a idade de uma pedra ou os mistérios da realidade, das águas, dos bichos, dos pássaros e das estrelas?
     Descobrir a arca encantada, onde se guardam os vestidos "cor do tempo", das princesas de "era uma vez", aquelas que se transformavam em pombas ou dormiam em caixões de cristal, à espera que o príncipe viesse despertá-las?
     Desfolhar as pétalas do sonho no país da noite?
    Abre um livro.
    Um livro é tudo isso de cada vez e, às vezes, ao mesmo tempo.   
   Um livro permite-te contactar com outras imaginações, outras sensibilidades.
    É a possibilidade de estares noutros lugares, sem abandonares o teu chão, de ouvires pulsar outros corações, de vestires a pele humana de outro ou outros. Sem deixares de ser tu.
    E com o livro a varinha de condão não está na mão das fadas, está em teu poder.
   É do teu olhar, de cada vez que te dispões a ler, que nascem aqueles mundos, caleidoscópicos, de maravilha – e só desaparecem quando fechas o livro.
   Mas, a um gesto do teu querer, voltarão a surgir sempre, sempre, sempre…
 Luísa Dacosta (introdução à obra História com Recadinho)
 
      No final do mês de janeiro trabalhei esta obra, que faz parte das metas curriculares e que nos ensina a dar, sem estar à espera de nada em troca, fazer o bem por fazer, mantendo-nos "invisíveis".
 
      Inicialmente analisamos a capa, as informações nela contidas e a ilustração. Em seguida pedi a cada aluno que, mediante o título e a imagem da capa, dissessem uma frase para em conjunto construirmos uma história, tentando imaginar do que se trataria a história que iríamos ler. Saiu uma história engraçada, mas que nada tem a ver com a história da obra!
 
         Era uma vez uma bruxinha que nasceu no reino das bruxas. Ela era muito bonita e simpática, mas sabia que as outras bruxas eram más. As bruxas faziam mal à bruxinha, insultando-a e batendo-lhe, por ela ser diferente delas.
         Ela vivia num sítio muito agitado, ouvia-se gritarias e era obrigada a trabalhar. Ela não gostava daquele sítio por a obrigarem a trabalhar.
         Um dia as bruxas más obrigaram-na a limpar o chão e ela não o fez. As bruxas ficaram muito zangadas com a bruxinha e castigaram-na. A bruxinha ficou muito triste e disse que não gostava delas.
         A bruxinha, como não gostava das bruxas, decidiu fugir para o reino mais próximo que não tivesse bruxas. Ela foi parar ao reino da Fantasia e lá conheceu um amigo que se chamava Joaquim.
         Eles foram passear e a bruxinha ficou espantada com o facto de as outras bruxas estarem lá e os terem assustado.
         Quando a bruxinha viu as bruxas, decidiu fugir com o Joaquim para uma terra que ninguém sabia onde ficava. Essa terra chamava-se a Terra do Amor.
        Quando lá chegaram repararam que estavam num túnel onde era tudo vermelho e mágico. Lá tinha vários corações e casas muito grandes e vermelhas. A bruxinha Mimi e o Joaquim foram até ao fim do túnel para descobrir onde ele ia dar.
        Quando chegaram ao fim do túnel, viram o lago do amor que tinha um arco-íris por cima e cisnes. Mas as bruxas encontraram-nos e transformaram-nos em sapos.
         O Joaquim e a Mimi, beijaram-se e transformaram-se em príncipes. As bruxas caíram ao lago e morreram. E os príncipes casaram-se e viveram felizes para sempre.
            Autores – alunos do 4º ano de escolaridade do Colégio Salesianos Porto
 
      Terminada a história pedi aos alunos que respondessem à questão: Que recadinho terá a autora para nós?
 
      O recadinho que terá para me dar a Luísa Dacosta que sempre que fazemos o bem recebemos mais em troca. (Tomás Salgado)
      O recadinho que a autora tem para me dar é que devemos ser amigos de todos, mesmo que sejamos diferentes. (Diogo Gama)

       O recadinho que terá a autora para me dizer é para sermos amigos de todos. (Hugo Carvalho)
 
      A obra inicia com um texto sobre o livro. Então, antes de começarmos a ler a história, pedi aos alunos que me respondessem à seguinte questão: O que é para mim um livro?
 
      Um livro, para mim, é tudo de bom, desde a história em si, até ao que o livro me transmite. (Diogo Dias)
      Um livro para mim é uma história com um final deslumbrante. (Telmo Ferreira)
 
      Um livro é um objeto que nos faz aprender. (Hugo Carvalho)
 
        Esta obra não apresenta um vocabulário simples de compreender, pois apresenta algumas expressões bastante simbólicas que não podem ser lidas à letra, mas sim interpretadas e compreendidas, como por exemplo: "...sorriso emoldurado por cachos de caracóis...", "...arrepiavam como guinchos de portas ferrugentas.", "... córregos d'água penteavam ervas...". Posto isto, fomos analisando o texto calmamente e tirando conclusões sobre o significado das mesmas, de forma a compreendermos melhor a história.
 
        Nas várias obras que trabalho com os alunos, peço várias vezes que ilustrem determinadas partes da história. Na minha opinião, a ilustração é uma maneira de compreender a história e mostrar que está a compreender o que está a ler, pois obriga-os a estarem atentos a certos pormenores, lerem e relerem, de forma a retratarem com o máximo de pormenor possível a descrição feita pelos autores. Outro aspeto importante na ilustração é a comparação com as ilustrações dos colegas, que, apesar de ter vários pontos comuns, são sempre diferentes. Daí eu insistir sempre que, quando estão a responder às perguntas de interpretação dos textos, devem procurar as respostas no texto e não na ilustração, pois esta depende, em grande parte, da interpretação e imaginação do ilustrador.
        Posto isto, quando chegamos à parte da história em que a bruxinha chegou ao mundo dos homens e a autora o descreveu, pedi aos aluno que representassem numa folha A4 o mundo das bruxas e o mundo dos homens, atendendo às descrições feitas pela autora.
 
 
       Com esta obra, aproveitei para fazer uma ligação à matemática, pois a dada altura, quando descreve as borboletas, a autora usa a seguinte expressão "o laminado frágil e simétrico das asas". Coincidentemente estávamos a trabalhar as simetrias de reflexão na área disciplinar de matemática e propus aos alunos que decorassem umas borboletas de forma simétrica. Desta forma também trabalhei a área da expressão plástica e já temos a sala decorada para darmos as boas-vindas à primavera. É muito bom quando podemos trabalhar diferentes áreas a partir, neste caso, de uma obra.
 
 
       Frustrada com o facto de todos fugirem dela, a bruxinha, triste, faz a seguinte reflexão: "... ninguém a aceitava e (...) que praticar o bem era, afinal, uma tarefa difícil."
       Com esta frase, lancei a discussão se realmente é difícil praticar o bem. Claro que a maioria disse que não, mas eu encaminhei a reflexão para as pessoas que são diferentes, aquelas que nos ensinaram que se se vestirem de determinada forma ou tiverem determinado aspeto não deveríamos confiar. Então, questionei-os se confiariam nessas pessoas para os ajudarem ou se também fugiriam. Terminada a chuva de ideias, pedi aos alunos que registassem as suas reflexões no seu caderno do projeto Pensar e Agir (ver http://darmaiseb1.blogspot.pt/2013/05/projeto-pensar-e-agir-project-think.html).

                Eu concordo com a bruxinha, que praticar o bem é um bocado difícil, porque há pessoas a dizerem-nos para fazer coisas más, e nós fazemos sem pensar antes. (Hugo Carvalho)

             Eu concordo com a bruxinha, porque há pessoas que praticam o bem e há pessoas que praticam o mal e os animais pensavam que era um truque para os matar. (Luana Meireles)

             Eu acho que praticar o bem é um bocadinho difícil, porque é preciso aceitar alguém  e ninguém aceitava a bruxinha. (Diogo Gama).
 
       Após as reflexões, continuamos a ler o texto até à parte em que a bruxinha se encontrava muito triste e frustrada por não conseguir ajudar as pessoas encontrando-se num dilema: "Se despisse a sua capinha perderia todos os seus poderes, com ela ninguém a aceitava." Então, pedi aos alunos que "resolvessem" o problema da bruxinha, prevendo como iria terminar a história, iniciando os seus textos com a seguinte expressão: Na manhã seguinte...
 
                Na manhã seguinte, a bruxinha mais fresca, decidiu ir dar uma volta na sua vassoura para conhecer melhor o mundo dos humanos, mas sem se aproximar de nenhum ser vivo.
                Ela pensou, pensou e teve uma ideia. E se ela, com os seus poderes mágicos, se transformasse num humano? Então, a bruxinha pegou no seu livro de magia, que tirou da escola de bruxaria e…
                - Alacazum…!... – transformou-se num humano. À noite, a bruxinha, saiu com uns meninos, mas esqueceu-se que o efeito só durava 10 horas e transformou-se novamente em bruxa. Todos correram em direções diferentes. A bruxinha, já cansada, foi novamente para a nuvem-berço dormir.
                No dia seguinte, a bruxinha acordou com uma ideia espantosa – ela tirava a capa de dia e à noite voltava a pôr a capa.
                Nesse dia, arranjou um esconderijo para colocar lá a capa e, num abrir de fechar de olhos, era humana. Nessa noite, quando ia colocar a capa, uma menina viu-a e ficou espantadíssima. Ela queria ser também uma bruxa! A bruxa também ficou espantada, porque ela não fugiu. Elas tornaram-se amigas e a bruxinha, às vezes, emprestava-lhe a capa para ser uma bruxinha durante alguns minutos. Com isso, arranjou muitos amigos e uma escola.
                No Carnaval, ambas foram de bruxa e a bruxinha mostrou-lhes alguns dos seus truques, com a ajuda da sua amiga.
Diogo Dias
 
 
               Na manhã seguinte, a bruxinha tentou pensar numa maneira de ter uma amiga. Subiu para a sua vassourinha e começou a procurar crianças para brincar. Viu muitas meninas a saltar à corda e decidiu ir lá ver. A bruxinha ia começar a saltar, mas quando a viram, todas as meninas fugiram deixando-a para trás.
                A bruxinha sentou-se no meio do chão a pensar:
                - Se não tirar a capa, como vou fazer amizades?
                A bruxinha por mais que pensasse não encontrou nenhuma solução. De repente, ouviu uma menina a brincar. A bruxinha começou a observá-la e viu que não estava a brincar com ninguém, mas percebeu que se estava a divertir com uma amiga imaginária. Por isso, a bruxinha, para não a assustar, decidiu ela inventar uma amiga imaginária. A Bruxinha chamou-lhe Ana e assim, todos os dias, brincava com ela sem ter que tirar a capa.
Bárbara Faria
 
                Na manhã seguinte, a bruxinha pensou… pensou… pensou… até que lá encontrou uma solução e lá a fez. Foi à procura das meninas e lá as encontrou. Ao princípio elas fugiram, mas ela disse:
                - Não sou uma bruxa como as outras, eu nasci diferente. Não sou maléfica e, se não vão ser minhas amigas por ser uma bruxa, pensem… Se fossem uma bruxa como eu e tivessem nascido em vez de más, boas e eu fosse uma rapariga humana, eu compreenderia e ficava vossa amiga. Por isso, acreditem em mim e sejam minhas amigas.
                As meninas ao ouvirem isso compreenderam e ficaram todas as melhores amigas!
Ana Rita Cabeço  

 
      Quando terminaram as suas histórias, os alunos partilharam-nas com os colegas. Em seguida terminamos a leitura da obra descobrindo afinal qual é o recadinho da autora e refletimos sobre as seguintes questões: Será que a bruxinha existe? Se sim, quem será? ; Como fazer chegar o recado da autora à bruxinha? As respostas foram várias e algumas bem originais!
 
 
      Esta obra permite-nos trabalhar não só o português, como outras áreas disciplinares, como foi referido anteriormente, mas também um aspeto fundamental na nossa vida em sociedade por vezes bastante esquecido: dar sem esperar receber nada em troca. Esta ideia de ser "invisível" quando praticamos as nossas boas ações, nem sempre é fácil concretizar e transmiti-la às nossas crianças, mas não deixa de ser um lindo valor a ensinar: ajudar por ajudar, porque é bom e faz-nos sentir bem! 
 
      Boas leituras para todos!
Ana Arada


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